Pedro Cabrita Reis | Unveiled Revealed
A arte contemporânea é imprevisível como os fenómenos sísmicos; partem de algo que se conhece (materiais, técnica, ciência), mas os resultados são quase aleatórios, como se dependessem apenas de "caprichos".
A arte contemporânea é imprevisível como os fenómenos sísmicos; partem de algo que se conhece (materiais, técnica, ciência), mas os resultados são quase aleatórios, como se dependessem apenas de "caprichos".
A arte contemporânea, como os fenómenos sísmicos, não segue cânones, representa (pode representar) a ruptura com as regras, todas as experiências, todos os resultados, são possíveis e validáveis.
Na arte contemporânea estabelece-se um diálogo entre o artista e o outro, em que o desafio chega a limites extremos, permitindo todas as leituras, até a de um confronto brutal do artista consigo mesmo e com o seu público que, em última análise, se confunde com o todo da sociedade.
Um sismo é o evento extremo de uma Natureza em confronto consigo mesma e com o Homem.
A arte contemporânea recorre a todos os materiais, frequentemente fazendo a reciclagem de materiais usados, de todas as proveniências, porventura como resultado da destruição de outros; os sismos mobilizam todos os materiais estruturais e não estruturais, deles resulta destruição e reciclagem.
A arte contemporânea constrói a ordem a partir do caos que pode ser a própria essência da arte; os sismos transformam a ordem (e a desordem) em caos, deste nascendo uma nova ordem.
A arte contemporânea depura-se por si mesma, elimina a "ganga", o fortuito, abre novos caminhos que conduzem ao progresso do conhecimento; os sismos ajudam a separar o trigo do joio, são ocasiões excepcionais para construir as novas urbes.
No caso da exposição do Pedro Cabrita Reis, tudo começou pelo caos da destruição de uma ordem quase pura que o branco puro das paredes criava; desse caos evidenciado pelas ruínas da destruição criou PCR uma nova ordem, num espaço quase nú que evidenciava as entranhas, a alma do que existe para lá das paredes derrubadas; nessa nova ordem era o próprio PCR que se expunha, se despia mostrando a sua vida, a sua alma, pontuada por pedaços da sua existência mais próxima ou mais remota, na arte ou fora desta.
Por isso faz todo o sentido o texto/ carta que ele mesmo escreveu, para si agora, ou para o filho, quando o amanhã, futuro, for o presente agora, fusão de tempos no mesmo espaço destruído, ou antes, desconstruído, que anuncia um tempo novo.
Tudo isso, essa leitura através do tempo, mais acrescenta ao momento sublime da figura nua que usou as paredes palimpsestos para nelas imprimir, letra a letra, o texto que nos ensina a ver, a arte, qualquer arte.
Aliás, o trabalho de PCR no espaço Appleton Square, criando uma instalação em que o próprio espaço parece, mas só parece, ser o principal protagonista, é o produto de um olhar multiplamente repetido de PCR sobre aquele espaço, num projecto que parte de uma ideia chave mas que se vai amaciando e afinando na medida em que a própria realidade transformada obriga a olhar de novo para um melhor entendimento.
O terramoto de Novembro de 1755 começou por criar a morte, a destruição, o caos; deste veio a nascer a nova ordem, que os desenhos de Eugénio dos Santos e Carlos Nardel traçaram de forma exemplar.
O terramoto e os incêndios, muitos deles voluntariamente propagados, expuseram as entranhas de uma cidade, exibiram-lhe a alma; dos montes iniciais de destroços, organizados ao acaso, ou melhor desorganizados, nasceu depois a plataforma que hoje é a Baixa de Lisboa, do rio até ao Rossio, marcando o princípio da nova ordem.
A nova Baixa escondeu a antiga mas, sob a nova aparência, subsiste a cidade velha, aqui e ali reconhecível, em paredes e muros, pedras e madeiras, a que a arqueologia vai dando novos sentidos.
Na sua dissertação, Manuel da Maia expôs a sua alma, toda a sua competência que nos legou um conjunto de escritos de excepcional inteligência e sensibilidade, um texto para o então presente, uma lição de vida para qualquer futuro.
De forma subtil, simultaneamente humilde, como quem tem dúvidas, e afirmativa, como quem tem certezas, MM ensina-nos a ver e a entender os planos da nova cidade, subordinada a uma ordem nova, criada sem mancha de acaso.
A perfeita esquematização do raciocínio de MM fala-nos de uma ideia amadurecida, como se tudo já estivesse planeado e apenas à espera que Deus ou a Natureza garantissem o pretexto para a sua aplicação prática. Mas, como se depreende da leitura da dissertação, tudo se passa como se a inteligência de MM conhecesse o seu destino mas aceitasse as inflexões do caminho, o jogo de máscaras com o poder ou os poderes, até se alcançar o resultado final, um plano genial que se cumpriu com desvios mínimos ao longo de um século e apesar de tudo e de todas as vicissitudes e modas.
É curioso registar que a obra de PCR e o próprio PCR são contestados e amados ou odiados, mas não deixam ninguém indiferente.
MM também não era homem de consensos e a sua obra mestra - a condução dos planos da reconstrução da cidade destruída, nas suas vertentes filosóficas e técnicas - suscitou admiração e desprezo, mas não deixou ninguém indiferente.
Afinal é este o inevitável destino dos grandes, na arte ou nas técnicas, em todas as facetas da vida.
Na arte contemporânea estabelece-se um diálogo entre o artista e o outro, em que o desafio chega a limites extremos, permitindo todas as leituras, até a de um confronto brutal do artista consigo mesmo e com o seu público que, em última análise, se confunde com o todo da sociedade.
Um sismo é o evento extremo de uma Natureza em confronto consigo mesma e com o Homem.
A arte contemporânea recorre a todos os materiais, frequentemente fazendo a reciclagem de materiais usados, de todas as proveniências, porventura como resultado da destruição de outros; os sismos mobilizam todos os materiais estruturais e não estruturais, deles resulta destruição e reciclagem.
A arte contemporânea constrói a ordem a partir do caos que pode ser a própria essência da arte; os sismos transformam a ordem (e a desordem) em caos, deste nascendo uma nova ordem.
A arte contemporânea depura-se por si mesma, elimina a "ganga", o fortuito, abre novos caminhos que conduzem ao progresso do conhecimento; os sismos ajudam a separar o trigo do joio, são ocasiões excepcionais para construir as novas urbes.
No caso da exposição do Pedro Cabrita Reis, tudo começou pelo caos da destruição de uma ordem quase pura que o branco puro das paredes criava; desse caos evidenciado pelas ruínas da destruição criou PCR uma nova ordem, num espaço quase nú que evidenciava as entranhas, a alma do que existe para lá das paredes derrubadas; nessa nova ordem era o próprio PCR que se expunha, se despia mostrando a sua vida, a sua alma, pontuada por pedaços da sua existência mais próxima ou mais remota, na arte ou fora desta.
Por isso faz todo o sentido o texto/ carta que ele mesmo escreveu, para si agora, ou para o filho, quando o amanhã, futuro, for o presente agora, fusão de tempos no mesmo espaço destruído, ou antes, desconstruído, que anuncia um tempo novo.
Tudo isso, essa leitura através do tempo, mais acrescenta ao momento sublime da figura nua que usou as paredes palimpsestos para nelas imprimir, letra a letra, o texto que nos ensina a ver, a arte, qualquer arte.
Aliás, o trabalho de PCR no espaço Appleton Square, criando uma instalação em que o próprio espaço parece, mas só parece, ser o principal protagonista, é o produto de um olhar multiplamente repetido de PCR sobre aquele espaço, num projecto que parte de uma ideia chave mas que se vai amaciando e afinando na medida em que a própria realidade transformada obriga a olhar de novo para um melhor entendimento.
O terramoto de Novembro de 1755 começou por criar a morte, a destruição, o caos; deste veio a nascer a nova ordem, que os desenhos de Eugénio dos Santos e Carlos Nardel traçaram de forma exemplar.
O terramoto e os incêndios, muitos deles voluntariamente propagados, expuseram as entranhas de uma cidade, exibiram-lhe a alma; dos montes iniciais de destroços, organizados ao acaso, ou melhor desorganizados, nasceu depois a plataforma que hoje é a Baixa de Lisboa, do rio até ao Rossio, marcando o princípio da nova ordem.
A nova Baixa escondeu a antiga mas, sob a nova aparência, subsiste a cidade velha, aqui e ali reconhecível, em paredes e muros, pedras e madeiras, a que a arqueologia vai dando novos sentidos.
Na sua dissertação, Manuel da Maia expôs a sua alma, toda a sua competência que nos legou um conjunto de escritos de excepcional inteligência e sensibilidade, um texto para o então presente, uma lição de vida para qualquer futuro.
De forma subtil, simultaneamente humilde, como quem tem dúvidas, e afirmativa, como quem tem certezas, MM ensina-nos a ver e a entender os planos da nova cidade, subordinada a uma ordem nova, criada sem mancha de acaso.
A perfeita esquematização do raciocínio de MM fala-nos de uma ideia amadurecida, como se tudo já estivesse planeado e apenas à espera que Deus ou a Natureza garantissem o pretexto para a sua aplicação prática. Mas, como se depreende da leitura da dissertação, tudo se passa como se a inteligência de MM conhecesse o seu destino mas aceitasse as inflexões do caminho, o jogo de máscaras com o poder ou os poderes, até se alcançar o resultado final, um plano genial que se cumpriu com desvios mínimos ao longo de um século e apesar de tudo e de todas as vicissitudes e modas.
É curioso registar que a obra de PCR e o próprio PCR são contestados e amados ou odiados, mas não deixam ninguém indiferente.
MM também não era homem de consensos e a sua obra mestra - a condução dos planos da reconstrução da cidade destruída, nas suas vertentes filosóficas e técnicas - suscitou admiração e desprezo, mas não deixou ninguém indiferente.
Afinal é este o inevitável destino dos grandes, na arte ou nas técnicas, em todas as facetas da vida.
João Appleton, Janeiro 2011
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